Entrevista com Fernando G. Lopes, Diretor do Instituto Totum

I-REC Day Brazil | Fernando G. Lopes

Os desafios e oportunidades do GAS-REC® e do I-REC® na descarbonização do setor energético.

por Heleno Quevedo,

O GAS-REC® é um certificado de garantia de origem do biometano, criado pelo Instituto Totum em 2020, para garantir a rastreabilidade e a comprovação da origem renovável do gás consumido por indústrias, transportadoras e outros setores. Ele funciona de forma semelhante aos certificados de energia renovável (I-REC), permitindo que empresas que consomem gás natural possam comprovar o uso de biometano sem a necessidade de mudanças físicas na infraestrutura do gasoduto. 

 Com a Lei do Combustível do Futuro, surgiu também o Certificado de Garantia de Origem de Biometano (CGOB), um novo mecanismo regulatório que será obrigatório a partir de 2026 para produtores e importadores de gás natural, visando aumentar a participação do biometano no mercado e reduzir as emissões do setor. 

No evento I-REC Day Brazil, um dos temas de destaque será justamente sobre o GAS-REC®, sua relação com o I-REC e o impacto dessas certificações no mercado de energia sustentável. Para aprofundar esse tema, o Portal Energia e Biogás entrevistará o diretor do Instituto Totum, Fernando G. Lopes, que trouxe informações exclusivas sobre a evolução dos certificados e o futuro do mercado de biometano no Brasil e também destacou o evento I-REC Day Brazil que ocorrerá no dia 25 de março de 2025. 

O I-REC Day Brazil, maior evento de certificados de energia renovável do país, chega à sua 3ª edição trazendo debates estratégicos sobre descarbonização, transição energética e as oportunidades oferecidas pelos certificados I-REC no mercado brasileiro. Para falar um pouco sobre o evento e sobre a importância estratégica dos certificados I-REC e GAS-REC o Portal Energia e Biogás teve um bate-papo com representantes do Instituto Totum. 

Confira a entrevista completa com Fernando G. Lopes, Diretor do Instituto Totum, sobre os certificados de ativos ambientais e as novidades que o Instituto Totum está preparando para a 3ª edição do I-REC Day Brazil. O evento promete ser uma oportunidade ímpar para o desenvolvimento do mercado e para o networking entre os principais players do setor. 

Entrevista

1. Sobre o mercado e os certificados I-REC

1.1. O I-REC Standard tem se consolidado como o certificado mais procurado no Brasil. Na visão de vocês, quais os principais fatores que explicam esse crescimento no mercado brasileiro? 

Fernando G. Lopes: O I-REC Standard de fato tem se consolidado como o certificado de energia renovável mais procurado no Brasil, e esse crescimento é resultado de diversos fatores. Um fator é a demanda corporativa por sustentabilidade, ou seja, cada vez mais empresas, tanto nacionais como multinacionais, assumem compromissos de redução de emissões e neutralidade de carbono. Elas veem nos I-RECs uma forma confiável e globalmente reconhecida de comprovar o uso de energia renovável. Além disso, o alinhamento às métricas de ESG (Environmental, Social & Governance) e aos compromissos de descarbonização (como RE100, SBTi etc.) impulsiona a procura por certificados críveis e internacionalmente reconhecidos. Outro fator é o inegável sucesso da inciativa, dado que o Brasil vem se mantendo entre os 3 maiores mercado de I-REC no mundo desde 2020 – lembrando que a demanda é totalmente voluntária. No ano passado foram emitidos cerca de 50.000.000 de I-RECs, cobrindo por volta de 20% da demanda de energia elétrica dos negócios no Brasil. Reflexo desse amadurecimento do mercado é o próprio I-REC Day, que inicialmente tratava quase exclusivamente das garantias de origem para energia elétrica renovável, mas hoje se consolida como um evento abrangente voltado a diversos instrumentos de descarbonização, como o biogás e hidrogênio, por exemplo. 

1.2. Qual é o papel do Instituto Totum na expansão e na regulamentação do mercado de certificados de energia renovável no Brasil, e quais são os desafios enfrentados nessa missão? 

Fernando G. Lopes: O Instituto Totum foi a principal responsável na conscientização sobre certificados de energia renovável de 2014 a 2020, em parceria com as associações fundadoras do programa (Abragel e Abeeólica), criando confiança e promovendo a adoção do programa no mercado brasileiro, sempre com o foco na voluntariedade. Hoje, nosso papel é manter a credibilidade e o reconhecimento internacional do sistema, ao mesmo tempo em que buscamos reduzir custos de transação e simplificar processos para os participantes, por meio de soluções tecnológicas. Acreditamos que não há necessidade em regulamentar o mercado de certificados no Brasil, dado que todos os participantes estão posicionados e a demanda é puramente voluntária – adotar mecanismos artificiais de aumento da demanda pode gerar ruídos no mercado. 

2. Transição energética e descarbonização

2.1. O painel sobre "Estratégias Empresariais para Descarbonização" aborda ações para reduzir emissões de gases de efeito estufa. Como vocês avaliam a aderência das empresas brasileiras a essas estratégias, especialmente no setor de energia? 

Fernando G. Lopes: As empresas brasileiras têm mostrado crescente adesão a estratégias de descarbonização, sobretudo no setor de energia, mas ainda há variações de maturidade e recursos entre elas. Instrumentos de mercado, como I-RECs (para eletricidade renovável), GAS-RECs (para gás renovável) e créditos de carbono, ajudam a criar planos de redução alinhados às curvas marginais de abatimento de emissões, viabilizando investimentos prioritários em iniciativas de menor custo e, posteriormente, o uso de certificados para compensar emissões residuais. Dessa forma, a descarbonização ocorre de maneira economicamente viável e transparente, reforçando o compromisso das empresas com metas de sustentabilidade.  

2.2. Com o aumento das exigências de descarbonização global, qual é o papel dos certificados de energia renovável, como os I-REC, na transição energética das empresas brasileiras? 

Fernando G. Lopes: Os certificados de energia renovável, como os I-REC, exercem papel fundamental ao proporcionar rastreabilidade e comprovação do uso de fontes limpas, permitindo às empresas brasileiras reduzirem suas emissões de forma transparente e reconhecida mundialmente. Isso incentiva a adoção de metas mais ambiciosas e viabiliza o investimento em novos projetos de energia renovável, colaborando para o cumprimento de compromissos de ESG e metas de redução de carbono. Dessa forma, os I-RECs tornam-se parte essencial da estratégia de transição energética, ao integrar-se à matriz elétrica e fortalecer a credibilidade dos processos de descarbonização corporativa. 

3. Desenvolvimento do setor de biogás e biometano 

3.1. O evento inclui um painel sobre a certificação de biometano. Quais as principais barreiras e oportunidades para produtores de biogás e biometano acessarem o mercado de certificados de energia renovável? 

Fernando G. Lopes: Produtores de biogás e biometano enfrentam desafios relacionados à regulação ainda em consolidação (fruto da Lei do combustível do futuro), custos de certificação, falta de escala e infraestrutura adequada para injeção ou comercialização do gás. Ao mesmo tempo, há oportunidades significativas, pois a certificação, como o GAS-REC, cria um ativo ambiental que pode ser comercializado de forma separada da molécula física. Esse mecanismo criado pelo Instituto Totum adiciona valor ao produto, amplia o acesso a mercados e reforça a credibilidade ambiental junto a investidores e consumidores. Com demanda crescente por energia limpa e metas de descarbonização corporativas, o biometano certificado surge como alternativa atraente, criando novas receitas e fomentando o desenvolvimento de projetos de energias renováveis no país. A Lei do Combustível do Futuro, ao criar um mandato obrigatório para compra de biometano, por um lado tende a viabilizar o financiamento de projetos e por outro lado cria distorção nos sinais de demanda e resposta da oferta. 

3.2. De que forma o Instituto Totum enxerga o impacto da produção de biometano na matriz energética brasileira e na geração de créditos de carbono? 

Fernando G. Lopes: O Instituto Totum reconhece que a produção de biometano traz um impacto positivo para a matriz energética brasileira ao substituir combustíveis fósseis e reduzir emissões de gases de efeito estufa, viabilizando uma transição energética mais limpa. Essa substituição permite, ainda, a geração de créditos de carbono, pois o biometano advém de fontes renováveis que evitam emissões relacionadas à decomposição de resíduos orgânicos (metano na atmosfera). Ao estimular a certificação de biometano e integrar esses certificados a mecanismos reconhecidos globalmente, o Totum fortalece a credibilidade e a rastreabilidade do processo, ampliando o valor ambiental e econômico do combustível renovável no mercado brasileiro. 

4. Finanças sustentáveis e crescimento empresarial

4.1. O painel "Finanças Sustentáveis e o Papel dos Ativos Ambientais" é um destaque no evento. Como as finanças sustentáveis podem alavancar os investimentos em energia renovável, especialmente em projetos de menor escala, como os de biogás? 

Fernando G. Lopes: As finanças sustentáveis podem alavancar investimentos em energia renovável, inclusive em projetos de menor escala, como os de biogás, ao reforçar a segurança de receita e a confiabilidade dos ativos. O BNDES, por exemplo, reconhece o GAS-REC como fonte adicional de receita, favorecendo a análise de financiamentos. Além disso, a Lei do Combustível do Futuro prevê um mandato obrigatório de compra por produtores e importadores de gás natural, garantindo um offtaker de boa reputação (triple A) que reduz riscos e facilita a captação de recursos. Paralelamente, planos estaduais de descarbonização do transporte, que incentivam o uso do biometano, contribuem para ampliar a demanda e impulsionar a viabilidade financeira desses projetos. Importante também lembrar que projetos de geração de biogás e biometano se enquadram nas principais taxonomias mundiais para os chamados títulos verdes. 

4.2. Quais são as vantagens para as empresas que utilizam certificados de energia renovável em termos de competitividade no mercado e acesso a financiamento? 

Fernando G. Lopes: Empresas que utilizam certificados de energia renovável demonstram comprometimento real com práticas sustentáveis, o que as torna mais atrativas para parceiros de negócio, clientes e investidores. Essa postura favorece a inclusão em índices e programas de compliance ESG reconhecidos mundialmente (como Dow Jones Sustainability Index, ISE B3, entre outros), que avaliam o desempenho socioambiental e influenciam a percepção de mercado. Além disso, a adoção de fontes limpas tende a facilitar o acesso a financiamentos verdes, reduzir custos de capital e melhorar condições de crédito, já que cada vez mais instituições financeiras consideram critérios de sustentabilidade ao avaliar riscos e conceder empréstimos. 

5. Inovação e networking

5.1. A terceira edição do I-REC Day inclui pela primeira vez um momento exclusivo de networking. Que tipos de conexões e parcerias vocês esperam fomentar com essa novidade? 

Fernando G. Lopes: Esse momento de networking surgiu como resposta direta à demanda dos eventos anteriores, em que participantes buscavam espaços para interagir com todos os elos da cadeia de negócios. Agora, por exemplo considerando a cadeia do biogás, reuniremos no evento participantes de vários setores: produtores de biometano, distribuidores de gás, consumidores, certificadores, consultorias técnicas e o mercado financeiro. O mesmo se aplica para a cadeia do setor elétrico. O I-REC Day pretende promover conexões estratégicas, trocas de experiências e parcerias capazes de impulsionar novos projetos, fortalecer o ecossistema de energias renováveis e acelerar a descarbonização no Brasil. 

5.2. Como o evento tem contribuído, ao longo das edições, para estimular a inovação no setor energético brasileiro e o engajamento dos diferentes stakeholders na busca por soluções sustentáveis? 

Fernando G. Lopes: Ao longo das edições, o I-REC Day tem se consolidado como um fórum de discussão e colaboração, envolvendo desde produtores e distribuidores de energia até investidores, consultorias e órgãos reguladores. Esse ambiente plural fomenta a troca de experiências e a apresentação de novas tecnologias e modelos de negócio, contribuindo para a inovação no setor energético brasileiro. Além disso, as dinâmicas de networking e os painéis temáticos estimulam o diálogo entre diferentes stakeholders, promovendo ações conjuntas para a descarbonização e o desenvolvimento de soluções sustentáveis alinhadas às demandas reais do mercado. 

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AGRADECIMENTOS

O Portal Energia e Biogás expressa seu profundo agradecimento à equipe do Instituto Totum, em especial a Fernando G. Lopes, pela conversa enriquecedora e pela generosidade em compartilhar conhecimento sobre certificados de ativos ambientais. Sua contribuição é essencial para levar informação de qualidade aos nossos leitores. Muito obrigado!

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